A Justiça Federal suspendeu nesta sexta-feira (19), em caráter liminar, a contratação do consórcio que venceu a licitação para a construção do autódromo do Rio. O pedido foi feito pelo Ministério Público Federal, que na ação pedia que nenhuma obra fosse realizada até que o Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA-Rima) fosse apresentado e a licença prévia fosse concedida pelo órgão ambiental.
A concorrência foi promovida pela Prefeitura do Rio, que anunciou em maio a Rio Motorpark como vencedora. A empresa ganhou o direito de construir e explorar um autódromo em um terreno de 4,5 quilômetros de extensão, cedido pelo Exército em Deodoro, na Zona Oeste da cidade. O contrato de concessão é válido por 35 anos e tem valor estimado em R$ 697 milhões.
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A Prefeitura afirmou que ainda não foi intimada e que vai analisar o caso quando for informada oficialmente. A Rio Motorpark afirmou que cumprirá todas as determinações judiciais e do edital de licitação e que já está fazendo o estudo de impacto ambiental (veja a íntegra da resposta no fim da reportagem).
Já existia uma decisão judicial proibindo que o governo estadual fizesse a licitação por falta de estudo de impacto ambiental. Como não havia sido citada na ação, a Prefeitura do Rio tomou a frente e fez a concorrência, que teve a Rio Motorpark como única participante.
O Ministério Público Federal (MPF) tentou suspender a licitação antes que o vencedor fosse anunciado, mas somente agora a Justiça federal concedeu a liminar. O projeto prevê a construção do novo autódromo do Rio no local conhecido como Floresta de Camboatá, em Deodoro, Zona Oeste da cidade. De acordo com o MPF, a área "é o único ponto remanescente de grande porte de Mata Atlântica em área plana na cidade".
Problemas na licitação do autódromo
O G1 mostrou que a Rio Motorpark foi criada em janeiro, 11 dias antes do lançamento da licitação do autódromo, com um capital social de apenas R$ 100 mil - o equivalente a 0,14% do capital necessário para fazer a obra. Mostrou também que o presidente era sócio da consultoria que ajudou a fazer a licitação. Revelou ainda que a Rio Motorpark usou uma garantia que não era válida, de uma empresa que não era banco.
Os indícios de irregularidades no processo de licitação chamaram a atenção da Comissão de Valores Mobiliários e do MPF. A CVM aponta questões que precisam de esclarecimentos, como o fato da empresa ter sido criada às pressas, sem sede definida e sem apresentar recursos suficientes para arcar com uma obra de quase R$ 700 milhões.
O MPF identificou indícios de direcionamento da licitação e enviou uma notícia-crime para o MP estadual (MPRJ), que é o responsável pelos casos na esfera municipal. O órgão federal pediu a apuração de crime da Lei nº 8.666/93, a Lei das Licitações. O MPF considerou que houve redução das exigências no edital, curto espaço de tempo e divulgação restrita, limitando a entrada de concorrentes.
O presidente da Rio Motorpark é José Antonio Soares Pereira Júnior, conhecido como JR Pereira, e presidiu também a Crown Processamento de Dados, que fez os estudos que embasaram o edital da concorrência.
A Crown faliu e acumulou R$ 24,7 milhões de débitos na dívida ativa da União, além de 20 ações trabalhistas. O empresário também está inscrito na dívida ativa como pessoa física, com saldo negativo de R$ 85,5 mil.
Disputa de sedes
O Grande Prêmio de Fórmula 1 é realizado desde 1990 no autódromo de Interlagos, em São Paulo. O contrato da empresa que administra a Fórmula 1 com São Paulo vence em 2020, e o governo paulista tem interesse em renovar o contrato.
Em maio deste ano, o presidente Jair Bolsonaro disse que o GP do Brasil passaria a ser realizado no Rio de Janeiro, em um autódromo a ser construído em Deodoro, na Zona Oeste da cidade. Um termo de cooperação, inclusive, chegou a ser assinado por Bolsonaro, o governador Wilson Witzel e o prefeito Marcelo Crivella.
O governador de São Paulo, João Dória, negou a mudança e fez críticas ao projeto, que foram rebatidas por Witzel.
O que diz a empresa
Veja íntegra da nota enviada pela Rio Motorpark:
"A empresa reitera que cumprirá todas as determinações da Justiça, bem como as indicadas no referido edital de licitação. Informa ainda que já está em curso a produção de amplo estudo de impacto ambiental na região e que, uma vez concluído, o mesmo será encaminhado às autoridades competentes, conforme determinam a legislações vigentes.
No entanto, a empresa registra profunda estranheza com o pedido liminar, uma vez que este pede cumprimento de obrigações que já estavam previstas no edital para serem cumpridas pela empresa antes da celebração do contrato.
Vale ressaltar que solicitação semelhante, requerida pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, já recebeu apreciação na Justiça, tendo já sido transitada em julgado no dia 30 de maio de 2018 - há mais de um ano.