Sejam questões de saúde, religiosas, ou estéticas, mudar hábitos alimentares requer paciência, disciplina e determinação. Quem decide adotar um novo cardápio transforma o paladar. Para parte da população, um almoço tradicional precisa ter arroz, feijão e bife, mas uma pesquisa do Instituto Ibops mostra que 28% da população brasileira tem procurado consumir menos carne.
Há cinco anos, o instrutor de Ioga e professor de História, Eudson Santos decidiu parar de comer carne. "Estava em um churrasco, olhei para a carne e resolvi que não ia mais comer. Fui na cozinha, descasquei um abacaxi, fiz o suco com a casca e coloquei a polpa na brasa", relembra.
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O instrutor conta que passou por um processo de transição. Primeiro deixou de consumir embutidos, depois a carne vermelha e, em seguida, frango e peixe. Hoje, Eudson tem uma dieta ovo-lacto vegetariano, baseada em ovos, leite e produtos derivados destes.
A mudança, segundo Eudson, não foi difícil. "Não foi uma obrigação. Foi um processo consciente. A minha consciência sentiu a necessidade de fazer e acabou sendo mais alta do que meu paladar".

Em uma pesquisa realizada em 2012, pelo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (IBOPE), cerca de 8% da população brasileira, aproximadamente 15 milhões de pessoas, se declarava adepta ao vegetarianismo. Atualmente, um projeto independente, o Mapa Veg, conta com 22.700 usuários cadastros, sendo que 62,7% se declaram vegetarianos; 28,7% veganos e 8,7% simpatizantes. Alagoas ocupa a 18º posição no ranking dos estados, com 106 cadastros, sendo que 55,7% da população declarou ser vegetariano e 36,8% ser vegano.
Benefícios
Pesquisas apontam que a dieta vegetariana diminui a ocorrência de doenças cardíacas, traz benefícios para pessoas afetadas tanto pelo diabetes do tipo I quanto do tipo II, auxiliam na redução de peso e nas funções intestinais. E, por possuírem menos gordura saturada, mais fibra e muitos fitoquímicos, nutrientes que combatem o câncer, é aliada na prevenção do câncer.
Eudson diz que sente o corpo mais leve e ser vegetariano também tem o benefício energético. "Eu acredito que tudo é energia. Quando temos medo, o corpo muda, trava, a carne fica rígida e liberamos muitos produtos químicos no corpo. É a mesma coisa com o animal. Essa energia do momento do assassinato do animal, consequentemente, é passada para gente", explica.
Um dos mitos da dieta vegetariana é o de que as pessoas que param de consumir alimentos de origem animal se sentem fracas. Eudson conta que, com ele, isso não acontece. "Vou para o trabalho de bicicleta, faço cross treino. Vai de cada um, mas eu me sinto mais leve por saber que estou cuidando do meu corpo. Na prática de Ioga, percebemos o corpo como uma extensão do Divino, extensão do Sagrado, uma unidade com o Ser Superior, e estou limpando o meu templo, o meu corpo".

A nutricionista e proprietária do restaurante Manga Verde, Moema Ferro, explica que alguns aspectos precisam ser considerados por quem deseja seguir o vegetarianismo. "É preciso ter muita cautela e começar sem pressa, eliminar primeiro a carne vermelha, depois o frango, por último o peixe. Assim o corpo vai se acostumando e, inclusive, a palatabilidade vai se adaptando a mudança da textura, que no início pode ser estranha. Mas se respeitar a transição é mais fácil aderir ao vegetarianismo".
Orientação nutricional também é essencial. Algumas pessoas, segundo Moema, ao decidir seguir ser vegetariano, acabam comendo de maneira muito errada, aumentando o consumo de determinados tipos de alimentos, como os carboidratos, o que pode acabar causando uma desnutrição ou levando à obesidade.
"Muitos não se preocupam em buscar uma alimentação mais rica, mais colorida, não se preocupam com o valor nutricional. E aumentam o consumo de massas, doces, açúcares, na tentativa de compensar a ausência de proteína", esclarece.

Cuidados
Moema Ferro explica que é preciso ter cautela. Uma alimentação vegetariana não equilibrada pode causar deficiência nas vitaminas do complexo B, especificamente a B12, zinco e ferro. Mas com equilíbrio, o vegetariano consegue ter uma alimentação completa e saudável. "Não existe deficiência na dieta vegetariana, o que existe é um novo modelo alimentar, em que a pessoa precisa aprender a extrair os macros e micros nutrientes das proteínas vegetais. E buscar o balanço em todas as refeições.. Muitos vegetais já suprem, tranquilamente, toda a necessidade diária dos macronutrientes, por exemplo. Basta complementar com os grãos, os cereais e as sementes, e assim, cria um aporte nutricional bem ajustado, adequado e sem deficiências".

O primeiro passo
Uma opção para quem tem o interesse em adotar uma dieta vegetariana, mas não sabe qual o primeiro passo, é a campanha mundial 'Segunda sem carne'. A proposta é simples: tirar produtos de origem animal - carne vermelha, frango, peixe, ovos e queijos - do prato pelo menos um dia por semana. A ideia é apresentar o vegetarianismo, convidando a população a reduzir os impactos sobre o meio ambiente, os animais e a saúde de toda população.
A campanha já foi aderida em 35 países, como os Estados Unidos e o Reino Unido, e é apoiada por nomes famosos, como o ex-Beatle Paul McCartney. No Brasil, a ideia foi proposta pela Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB).
Em Maceió, o restaurante Manga Verde, localizado na Avenida Doutor Antônio Gomes de Barros, a antiga Amélia Rosa, na Jatiúca, aderiu a 'Segunda sem carne'. "No restaurante sempre oferecemos um prato como 'sugestão do dia' e os das segundas-feiras são sempre sem carne", explica a nutricionista Moema Ferro.
O cardápio do Manga Verde conta com opções de pratos vegetarianos prontos e opções para montar. "Quando começamos, o cardápio era 50% vegetariano, mas pela procura incluímos mais opções com carnes. Muitas pessoas ainda não têm o hábito, e no Nordeste o consumo de carne é muito enraizado. Mas estimulamos que o nosso cliente descubra novos sabores e procure pelo menos diminuir o consumo dos alimentos de origem animal", diz Moema.
A nutricionista explica que a procura, tanto no restaurante quanto no consultório cresceu. As pessoas estão mais abertas ao novo e curiosas para experimentar. Mas as refeições fora de casa ainda são difíceis para os vegetarianos. Isabela Barbosa, formada em gastronomia e casada com Eudson, conta que começou a estudar a culinária vegetariana por sentir falta de opções na cidade.

"Todos os lugares que vamos servem carne. Para ele, é muito difícil sair para almoçar em self-service, por exemplo. Já passamos por uma situação de chegar em um lugar que o feijão era com carne, o arroz tinha carne, o macarrão tinha algo com carne e ele acabou comendo só um purê de batata com farofa", relembra. Eudson emenda que a única vantagem, nesse sentido, é que o preço do prato acaba sendo mais barato.
Isabela começou a produzir antepastos, molhos, pães de queijo fake e percebeu que as pessoas estão mais curiosas, procuram saber quais são os ingredientes. "A maioria achava que vegetariano só comia folha, ou que a comida vegetariana é ruim. Mas percebi que as pessoas têm curiosidade em saber se é bom". Os produtos podem ser encomendados pelo número (82) 99607-8648.

Razões para se considerar o vegetarianismo
São diversos os motivos que levam as pessoas a se tornarem vegetarianas. Ética, saúde, sociedade. Devastação das florestas tropicais, escassez e poluição da água do planeta, religião. Para Eudson, a prática da Ioga contribuiu para a decisão. "Desde pequeno sempre gostei muito de animal. Eu via uma contradição em gostar e comer o animal. Mas nunca tive a disposição de realmente parar, pois achava que para tirar a carne, tinha que ter um suplemento alimentar. Quando comecei a praticar e viver o Ioga, acabei descobrindo que dentro dos conceitos, existe o Ahimsa, que é a não-violência", conta.
O princípio não se refere apenas à violência física. "A não-violência pode ser de vários modos, com o corpo, o emocional. A não-violência com o irmão, com nenhum ser senciente. E foi onde se encaixou a opção por não me alimentar dos companheiros animaizinhos", explica.
Para quem quer incentivos para parar o consumo de alimentos de origem animal, Eudson indica o documentário 'A Carne Fraca'. "Ele dá uma ampliada nos motivos para não comer nada de origem animal", explica Eudson.