Períodos de longa estiagem, sol intenso e pouca água para abastecimento da lavoura são relatos comuns em Alagoas. Some-se a isso a falta de informação sobre a melhor forma de cuidar do solo e mantê-lo com condições suficientes para a produção de alimentos. Diante deste cenário, proprietários de chácaras e mesmo de pequenos lotes se veem inclinados a aceitarem uma proposta de uma empresa que trabalha limpando fossas na cidade de Arapiraca: despejar os efluentes como se fossem adubo e como forma de aguar a terra. Além de ser proibido, o lançamento de dejetos desse tipo estraga o solo e pode até mesmo contaminar o lençol freático.
Antes de oferecer o produto como "adubo", a empresa prestadora do serviço faz a retirada dos efluentes de fossas residenciais e comerciais ao custo de R$ 300. Caso seja exigido nota fiscal, esse valor pode aumentar, segundo informou o atendente do estabelecimento, sem arrodeio, conforme constatado pela reportagem. Demonstrando falta de conhecimento, ou mesmo má-fé, também garantiu que os dejetos não prejudicam o solo, quando lançados sem tratamento. "Quer fazer o teste?", ofereceu o serviço, ao ser questionado se não seria prejudicial à terra e às plantações.
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Esse atalho encontrado pela coletora de fossas é uma forma de economizar ou mesmo faturar mais, já que em Arapiraca não há nenhuma empresa especializada para tratamento de resíduos deste tipo e, com isso, os coletores são obrigados a transportar os efluentes até a cidade de Penedo, que fica a uma distância de 72 km.

De acordo com a superintendente de Meio Ambiente da Prefeitura de Arapiraca, Pricila Moura, o município não tem conhecimento do lançamento de dejetos no solo. Ela confirmou que a medida não é permitida por lei ambiental, pois pode contaminar as águas subterrâneas, "que muitas vezes são utilizadas, após tratamento, como água potável pela população".
"Os caminhões que realizam a limpeza de fossas são orientados a se dirigirem para a cidade de Penedo, local aprovado pelo Instituto do Meio Ambiente (IMA) desde o dia do encerramento do lixão", reforçou a superintendente. O antigo lixão de Arapiraca, que possuía áreas para o lançamento dos dejetos, foi fechado em dezembro de 2016, por decisão do IMA.
No Instituto do Meio Ambiente, a informação é de que qualquer empresa coletora de fossa precisa de licença ambiental para funcionamento, assim como para o lançamento de efluentes. O órgão comunicou não ter conhecimento das ocorrências em Arapiraca e se colocou aberto a denúncias, caso haja irregularidade por parte de alguma empresa ou estabelecimento ao lançamento de dejetos no solo indistintamente. "É preciso que se atendam a condicionantes e se tenha licença ambiental para atuar neste ramo", reforçou.
Entre as pessoas que chegaram a utilizar os efluentes, está a empresária Maria Lira. Moradora de uma ampla chácara na cidade e sem ter conhecimento devido sobre os problemas que causam ao meio ambiente, ela aceitou, por influência de um parente, o despejo dos resíduos em área onde planta capim para alimentação animal. O serviço somente foi interrompido quando, pela segunda vez em que tinha permitido o lançamento, foi avisada por um amigo zootecnista, Allex Carvalho, que cuida dos animais na propriedade, sobre os perigos para o solo que o produto poderia causar. Decidiu parar e contou que várias outras pessoas conhecidas já tinham aceitado a proposta.
"Embora o capim tenha crescido com mais rapidez e até com uma cor esverdeada, indicando vigor, o solo pode conter vermes, entre outras bactérias, que podem acabar contaminando o animal e por consequência afetar a nós humanos, que consumimos carne, por exemplo", alertou Carvalho.