Feirantes de rua em Maceió prometem represália contra um projeto da Secretaria Municipal do Trabalho, Abastecimento e Economia Solidária (Semtabes), que pretende padronizar todas as barracas das nove feiras mapeadas pelo órgão. Até aí, tudo bem. O problema está no modo como elas serão dispostas: "Eles querem que a gente arme e desarme o nosso cantinho todos os dias? De jeito nenhum. Vamos enfrentá-los", afirma comerciante.
AGazetawebconversou com a direção de Abastecimento da Semtabes, bem como percorreu algumas feiras livres na capital. Segundo a diretora, Íria Almeida, das nove feiras controladas pelo órgão, quatro estão regularizadas porque possuem cadastro junto à Secretaria do Trabalho, enquanto outras cinco atuam ilegalmente, mas o órgão garantiu que vai regularizá-las até o final de março.
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"No momento, estamos com nove feiras sob controle, e outras duas serão construídas e regularizadas, uma no conjunto Carminha, no Benedito Bentes, e outra no Aprígio Vilela, também no Benedito. Queremos deixar claro que o feirante cadastrado no Município tem licença e não pode ser retirado do local de comércio", informa Íria.
A diretora de Abastecimento explicou que a secretaria elaborou um projeto no ano passado que objetiva não somente cadastrar os feirantes, mas buscar parcerias para capacitar todos os comerciantes junto ao Sistema S (Senac, Sesc, Sesi, Senai) e padronizar as barracas, de forma que todas obedeçam a um parâmetro.
"Este é o primeiro projeto de requalificação dos mercados e feiras livres, ou seja, todas atuavam de forma irregular em Maceió. Hoje, elas ainda causam alguns problemas, gerando acúmulo de lixo, atrapalhando o trânsito e algumas até incomodam moradores. Ao todo, 600 feirantes já foram cadastrados e trabalham sem dor de cabeça", comenta a diretora.

Íria Almeida chama a atenção para a importância do projeto, que visa não só promover a melhoria estética das feiras. O principal foco é qualificar o feirante e integrá-lo a um sistema voltado à preservação do meio ambiente e um bom convívio com clientes, moradores e condutores. A diretora destacou, por sua vez, que ainda não sabe quando ocorrerá esse processo, que vai depender das parcerias com o setor privado a serem firmadas ao longo deste ano.
Por outro lado, o que preocupa realmente os feirantes é a padronização das barracas, de forma a tornar as feiras um comércio volante, isto é, as barracas serão removíveis. "Estabelecemos uma diferença entre o mercado e a feira. O primeiro se trata de um comércio fixo, mas o segundo precisa ser móvel, volante, porque é uma feira. Quanto ao espaço, temos que ver com a SMCCU [Superintendência Municipal de Controle do Convívio Urbano] para saber se as feiras ficam ou não no mesmo espaço após as ações do projeto", reforçou a diretora.
As feiras cadastradas ficam situadas nos bairros da Jatiúca, Jacintinho, Santa Lúcia/Tabuleiro (conjunto Cleto Marques Luz) e Cidade Universitária (entre o Graciliano e o Village). Já as irregulares comercializam nos conjuntos Eustáquio Gomes e Novo Jardim (ambas na Cidade Universitária), Benedito Bentes, Tabuleiro do Martins e Levada.
O projeto conta com parcerias públicas, como a SMCCU, Superintendência de Limpeza Urbana de Maceió (Slum), Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito (SMTT), Superintendência Municipal de Energia e Iluminação Pública (Sima), Secretaria Municipal de Infraestrutura (Seminfra) e Guarda Municipal.
Para constituir uma feira, a Semtabes informa que uma comissão de, no mínimo, cinco pessoas, precisa ir à secretaria e formalizar o pedido. O órgão avalia o pedido e dá o resultado.

'Vamos protestar sim'
A reportagem conversou com vários feirantes que aprovam a padronização, mas se dizem contrários ao modelo volante. Marilene Maria dos Santos, que comercializa há oito anos na feira do Jacintinho, lamenta que as vendas estão fracas e o movimento só é intenso em tempos de festa. A falta de divulgação é o maior problema enfrentado diariamente pelos feirantes, conforme alega Marilene.
"A gente sempre fala com o administrador, mas não tem jeito. Quanto ao novo projeto da prefeitura, não acho uma ideia boa, porque teremos que carregar nossas mercadorias e não se sabe se ficaremos no mesmo local sempre. Ou seja, poderá ser uma bagunça", comentou Marilene.

Há 25 anos comercializando confecções na feirinha do Jacintinho, Maria de Lurdes prometeu se rebelar caso o projeto seja concretizado. Segundo a comerciante, a organização é válida no que diz respeito a uniformizar as barracas. "Aceitamos a padronização, mas queremos continuar fixos aqui, até porque o Município só deu o espaço, e o restante das coisas da estrutura, nós que colocamos. Uma cerâmica do piso não foi colocada por eles. Nunca, ninguém veio levantar nosso astral", disse Lurdes.
Josilene Maria da Conceição, comerciante há quase 20 anos, também não se alegrou com a notícia. Ela e os demais foram pegos de surpresa e disse que todos os feirantes ficarão revoltados. "Imagine você expor a mercadoria todo santo dia. Com certeza, vai ter confusão aqui, porque construímos tudo e até empréstimo fizemos".
Na Jatiúca
A reportagem também esteve no bairro da Jatiúca, onde conversou com o administrador Ednelson Oliveira. De acordo com o funcionário da Semtabes, o Ministério Público Estadual (MPE) não quer nenhuma feira na rua e a medida tomada pela secretaria é positiva, porque a intenção do Município é apenas "somar". A taxa hoje varia de R$ 16 a R$ 60, a depender da quantidade e do tamanho das barracas.
"Sabemos as dificuldades enfrentadas pelos feirantes, mas queremos otimizar os serviços e o projeto vem para isso. Inclusive, os feirantes cadastrados e inseridos neste padrão vão poder abrir crédito para microempreendedor", informou o administrador.

Há mais de 30 anos, Manoel Evilásio vende frutas, verduras e cereais na feirinha e está preocupado com o destino da mercadoria, porque é perecível. "Rapaz, seria muito bom que todas barracas ficassem iguaizinhas, mas precisamos de um local específico, até porque a feira funciona diariamente. Para onde vão minhas frutas, alimento que se estraga rapidamente? Necessitamos de uma reunião com a Semtabes para conversar direito sobre tudo e chegar a um entendimento", pontuou.
Maria Edneide Santos tem mais de uma barraca na feira e afirma ter medo das novas mudanças pela falta de transporte. Além disso, o esposo é deficiente. "Como é que eu iria montar e desmontar tudo? Minha mercadoria é pesada. Disseram, inclusive, que fariam um box fixo e, agora, querem mudar. Nós somos antigos aqui e a gente não tem benfeitoria nenhuma por parte da secretaria. Por outro lado, não contamos com uma comissão de feirantes para organizar e defender nossas necessidades. O que falta é união", desabafa a feirante.
