Mesmo em final de mandato da atual legislatura, a Câmara dos Deputados aprovou projeto que modifica a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e permite aos prefeitos gastarem mais de 60% das receitas com a folha de pessoal. A matéria, comemorada pela Associação dos Municípios Alagoanos (AMA), segue para sanção presidencial para entrar em vigor. Para especialistas, a medida segue em sentido contrário a necessidade de equilíbrio fiscal no País e poderá agravar ainda mais o atual quadro, ao liberar ainda mais os gastos para os gestores.
Pela proposta aprovada, quando as receitas dos municípios sofrerem queda acima de 10%, os prefeitos poderão consumir mais de 60% dos recursos para pagamento de pessoal. A polêmica decisão, se passar a valer, livra os prefeitos de punições e contraria a LRF, uma lei complementar criada pelo Poder Executivo e sancionada pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e que tem como objetivo impor o controle de gastos à União, estados e municípios, condicionando-os à capacidade de arrecadação dos tributos de cada ente federativo.
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Caso entre em vigor, a mudança beneficiará prefeituras como a de Maceió, administrada pelo prefeito Rui Palmeira (PSDB). Segundo dados do Tesouro Nacional, o município gasta 62% de sua arrecadação com o pagamento de pessoal - que inclui servidores, comissionados e aposentados. O limite máximo até então permitido é de 60% e os gestores e municípios que descumprirem podem sofrer sanções que incluem até mesmo o cancelamento de repasses de recursos do governo federal para convênios com as localidades.
"Não há no que se discutir. Considero uma forma justa. As prefeituras perderam índices do FPM [Fundo de Participação dos Municípios], mas mantêm o mesmo quadro efetivo. É impossível para o gestor manter o percentual exigido pela LRF numa situação dessa. Há quatro anos que vivemos momentos de instabilidade financeira no País e a tendência é piorar. A cada dia tem sido mais difícil para os gestores", avalia o presidente da AMA, prefeito de Cacimbinhas, Hugo Wanderley.
Ele justifica a necessidade de aprovação da medida, ao afirmar que a maioria dos 102 municípios alagoanos precisam manter programas federais com pessoal e isso implica em gastos, além dos reajustes salariais ao funcionalismo público. "Fica difícil cumprir essa meta de 60%", pontua.
De acordo com o Índice de Gestão Fiscal da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), publicado em 2016 e até então o único a tratar sobre a questão, 87% dos municípios brasileiros já enfrentavam a pior situação fiscal dos últimos 10 anos. No documento, são citados entre as causas os elevados gastos obrigatórios com o pagamento de pessoal, no momento em que as receitas caem, como acontece atualmente, traduzindo-se em mais endividamento para as prefeituras. Como resultado, R$ 11,4 bilhões já deixaram de ser investidos pelos municípios somente em 2015, devido também à retração econômica no País, que resultou na redução das receitas.
Para especialistas da área política, para que o equilíbrio fiscal dos municípios seja preservado, o correto seria fornecer às prefeituras mecanismos eficazes para o corte de despesas, que incluem a redução de privilégios, ao invés de permitir mais gastança aos gestores. Liberar a possibilidade de ampliação das despesas com pessoal, consideram, deve fazer crescer ainda mais o deficit público e incentivar as prefeituras a serem menos cuidadosas na contenção dos custos.