Os tradicionais retratos de família foram transformados em lembretes da partida dos moradores do Pinheiro, um dos bairros afetados pelos afundamentos de minas de sal-gema na capital alagoana. O projeto do artista visual Paulo Accioly, "A Gente Foi Feliz Aqui", faz intervenções artísticas nos imóveis da região com imagens em tamanho real das famílias e lembranças dos antigos habitantes.
Um casal dançando em uma sala em ruínas, uma família abraçada, um antigo retrato de um ancestral. O que liga os retratos feitos por Accioly, também ex-morador do Pinheiro, é a ideia de dias que não mais virão. "Eu morei lá por alguns anos, mas conheço gente que morou 60. A ideia é dar um mínimo de visibilidade para essas pessoas que moraram ali", conta.
Leia também
Uma das histórias contadas é a de Juliana Aragão, que morou na casa dos pais por cerca de 10 anos, antes do início das rachaduras. "Ficava aquela expectativa: 'essa situação vai passar? Vai voltar tudo ao normal?'", conta Juliana, que agora está ao lado de seus familiares no interior de sua antiga residência, em tamanho real - mas sem as cores de antes.

O tempo se esgotou e não dava mais para perguntar, os vizinhos se foram, e a família de Juliana teve de partir também. "Ficou muito esquisito, não dava mais", conta. No muro da residência, uma foto de seus familiares segurando a placa que adquiriram quando compraram a casa e que resume as expectativas de quando se mudaram: "nosso pedacinho do céu".
Accioly espera que o projeto seja concluído em meados do ano que vem. "É um projeto de pequena escala, os materiais são caros e sai tudo do nosso bolso", diz. Os moradores são contatados, chamados para tirar uma foto, que é impressa em tamanho real e afixada na residência. A equipe faz os trabalhos sempre acompanhada das famílias, que contam suas histórias.
"Ouvi muita história, irmãs que moravam lado a lado desde que nasceram e hoje uma está no Canaã e outra em Atalaia [no Agreste do Estado]. Essa ideia de comunidade que existia no Pinheiro, não existe mais, cada um foi para um local diferente, outro bairro, outra cidade, outro país", conta o artista.
Para o futuro, a ideia é organizar um mapa interativo. Um mostraria o êxodo, para onde as pessoas foram e como a comunidade que antes era coesa se dissolveu. O segundo, afetivo, pretende mostrar a história dos moradores e o que os fizeram felizes no Pinheiro. Por enquanto, é possível conferir alguns relatos e retratos noInstagram do projeto.
"Temos pouco tempo, o local está se deteriorando rapidamente e as propriedades estão deixando de ser dos moradores e passando a ser da Braskem. Depois que essa troca de posse é feita, não podemos intervir no imóvel", explica Accioly.
Uma exposição também está nos planos futuros da equipe, que por enquanto está focada em documentar a história das famílias. "O que aconteceu ali foi grande, mas não recebeu a visibilidade que merecia. Há muita história de luto, mas eu queria registrar a felicidade, o porquê as pessoas foram felizes ali", contou o artista visual.