
Nas paredes, frases motivam mulheres a manter a cabeça erguida. "Nada é mais forte do que uma mulher que se reconstruiu", diz um dos pôsteres.
Os lembretes preenchem paredes da ONG Bem Querer Mulher, localizada no Morumbi, zona oeste de São Paulo. A entidade atua na cidade que, só no ano passado, teve uma média diária de 357 casos de violência contra mulheres registrados.
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Há 20 anos, a ONG mantém um trabalho multidisciplinar para acolher vítimas de violência doméstica. Lá, recebem assistência jurídica, psicológica, orientação de assistente social e participam de cursos profissionalizantes.
A Folha conversou com quatro mulheres que procuraram ajuda há pouco menos de um ano e manterá a identidade delas preservada —os nomes usados neste texto são fictícios.
Apesar de perfis diferentes, todas definem que as relações drenaram a autoestima. Destruída, acabada, envergonhada são alguns dos adjetivos usados ao lembrar do momento que buscaram ajuda.
Com os apoios que receberam, dizem que se sentem fortalecidas, compreendem os abusos que viveram e se veem livres para estudar, trabalhar e fazer aquilo de que gostam. Também relatam o uso de antidepressivos, identificam quais violências viveram e, algumas, classificam os agressores como narcisistas.
Maria lembra que o ex-marido, com quem viveu junto por mais de 40 anos, zombava dela quando dizia que gostava de dançar. "Sobe na mesa", debochava ele, que por mais de 20 anos manteve uma relação violenta com ela.
No fim, ela contou com a ajuda de um dos filhos para denunciar a violência do marido. "Você chega aqui semimorta, sem um batom, sentindo-se um lixo. [As agressões] são diárias, nas mínimas coisas e aquilo vai acabando com você", diz, recordando que sentia vergonha de pedir ajuda.
Ela afirma que começou a ter consequências psicológicas, como crises de ansiedade e pensava em suicídio. Mesmo assim, ficar longe dele não foi fácil. "Sabia que era ruim, mas era como um vício, dava vontade de voltar."
Após sessões de terapia e rodas de conversa, entende o que passou. "Comecei a ver que o errado é ele", diz ela, que passou a viver sozinha há menos de um ano, ainda depende da ajuda dos filhos para se sustentar e trava na Justiça uma briga pela divisão de bens.
Já enxerga, porém, a vida com mais liberdade e incorporou a dança a sua rotina. Hoje, não pensa em relacionamentos e brinca não querer cueca no seu armário. Usaria a peça, diz, apenas para ser pano de chão.
A imagem mostra uma parte do cabelo cacheado de uma pessoa, com mechas soltas e uma textura volumosa. O fundo apresenta uma sombra projetada, criando um padrão de linhas sobre a superfície.