
A PEC 14/2024, quer incluir no art.6° da Constituição Federal do Brasil, especificamente no Rol dos Direitos Sociais, o Direito ao Cuidado como forma de contemplar uma parcela invisível da sociedade responsável e encarregada dos cuidados com outras pessoas. Sejam elas durante a maternidade, na infância, para as pessoas com deficiência, para os idosos e/ou pessoas que tenham sofrido algum acidente ou doença que requeira cuidados paliativos.
Para o Direito, essa possibilidade de mudança causará impacto direto na vida das mulheres, que renunciaram a seus sonhos, vontades e demais profissões para se dedicarem ao cuidar de outrem sem garantias de remuneração ou direitos previdenciários.
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Para Heleieth Saffioti, socióloga brasileira, que analisou os mitos femininos na sociedade, creditar às mulheres o trabalho do cuidado como um dom natural e não designado socialmente, tem feito mulheres exercerem durantes gerações trabalho não remunerado.
E quando a mulher que cuida precisa de alguém, quem cuide dela? Quem cuida da mulher no puerpério ? Quem cuida das pessoas com doença mental na sua família? Assim também é natural que estas mesmas mulheres sejam cuidadas por outras mulheres como, por exemplo, filhas, irmãs, enteadas, primas, noras etc, como forma social de retribuição - ou seja, mulheres cuidam de todos, incluindo de outras mulheres, ainda que tenham filho, marido ou companheiro.
Com isso é incomum homens que se cuidam sozinhos, pois geralmente, haverá uma mulher, que desempenhará para ele, direta ou indiretamente, atividades de cuidados, incluindo cuidados domésticos ou de higienização. Enquanto as mulheres, cuidam de si e de outros; cuidam da casa, da família, das crianças, dos idosos, das pessoas acometidas por doenças ou cirurgias, das pessoas em situação de cárcere, entre outras situações.
Para a Medicina, o cuidado é algo que se observa diariamente sobre o impacto da sobrecarga na saúde das mulheres: depressão, ansiedade, dores crônicas e exaustão são comuns entre aquelas que cuidam de filhos, pais, companheiros ou outros entes queridos sem qualquer apoio do Estado.
Essa PEC reconhece que cuidar é trabalho, não um dever “natural” das mulheres. É um passo fundamental para que políticas públicas garantam rede de apoio, proteção social e serviços auxiliares.
Priorizar e valorizar o cuidado com o outro é investir em saúde pública, em dignidade e em justiça social. Quem cuida também precisa ser cuidado — e o Estado precisa assumir essa responsabilidade. Aprovar essa PEC é proteger a vida de milhões de mulheres que hoje são as maiores responsáveis pelo bem-estar coletivo sozinhas e em silêncio.
Paula Lopes (advogada) e Marília Magalhães (médica)
Ativistas pelos Direitos das Mulheres
*Os artigos assinados são de responsabilidade dos seus autores, não representando, necessariamente, a opinião da Organização Arnon de Mello.