
O deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) completou na madrugada desta quarta-feira (16) uma semana em greve de fome. O ato é um protesto do parlamentar contra o avanço de um processo que pode cassá-lo na Câmara dos Deputados.
Glauber é alvo de denúncia feita pelo Partido Novo que o acusa de ter quebrado o decoro parlamentar ao agredir e expulsar do prédio da Câmara, com chutes e empurrões, um militante do Movimento Brasil Livre (MBL).
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A cassação de Glauber Braga recebeu "sinal verde" do Conselho de Ética, em uma longa reunião na última quarta (8).
Por maioria de votos, o órgão concordou com o parecer de Paulo Magalhães (PSD-BA), que afirmou haver indícios para que o deputado do PSOL perca o mandato.
O parlamentar, que anunciou o jejum ainda durante a reunião, acusa Magalhães de conduzir o caso de forma "parcial".
Ele diz ser alvo de uma perseguição política, que há interferência do ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL) no processo e que a expulsão do militante do MBL foi usada como pretexto para uma retaliação de Lira.
O protesto do deputado, segundo ele próprio, é uma reação ao avanço do procedimento disciplinar e à possibilidade de o caso chegar ao plenário principal da Câmara, a quem cabe aprovar ou rejeitar — em definitivo — a cassação de um parlamentar.
Há mais de 168 horas sem se alimentar, Glauber Braga também tem dormido dentro de um dos plenários das comissões da Câmara — o mesmo que sediou o encontro que deu avanço ao processo de cassação do parlamentar.
Acompanhado por profissionais de saúde, Glauber tem sido submetido a exames frequentes. Com o passar dos dias, a entrada e a saída de visitantes na sala em que Glauber permanece também passou a ter maior restrição, a fim de evitar que o parlamentar adoeça.
Nesta terça, por recomendação médica, o deputado foi impedido de participar de um encontro com membros do movimento estudantil. Mas, quase uma hora depois, ele contrariou as orientações e fez uma rápida aparição, sem discursar.
Acompanhamento de saúde
A deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS), que havia se reunido pela manhã com o parlamentar, afirmou que a avaliação é de que o jejum tem debilitado o corpo de Glauber Braga.
O primeiro informe da equipe do parlamentar apontava que Glauber deu início à greve de fome com 91,7 kg.
A última atualização, divulgada pela manhã desta terça, indicou que o deputado estava com 87,1 kg.
De acordo com a assessoria de Glauber Braga, os exames têm sido feitos duas vezes por dia. A equipe médica tem mantido o parlamentar hidratado por meio de soro, isotônicos e água.
O deputado relatou, nesta manhã, ter começado a sentir dores. Ele disse, no entanto, que não desistirá do jejum.
"Meu corpo já começa a dar sinais. Tenho tido dor de cabeça, início de desconforto na barriga, mas a cabeça está firme e a missão de continuar nesta batalha mais ainda", afirmou Glauber Braga.
Estratégia da defesa
Os advogados de Glauber Braga ainda avaliam quais medidas poderão ser adotadas. A única certeza é que haverá apresentação de recurso contra o processo à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.
Previsto dentro do Código de Ética da Câmara, o recurso à CCJ pode suspender o processo. Pelas regras, poderá ser apresentado pela defesa de Glauber até o próximo dia 22.
No recurso, o parlamentar e seus advogados não podem questionar o mérito da decisão, mas podem apontar vícios dentro da condução do processo e defender que houve desrespeito às normas e à Constituição ao longo do debate da denúncia no Conselho de Ética.
Depois que a defesa protocolar o recurso, o colegiado terá até cinco dias úteis para analisar os argumentos e decidir se acolhe ou rejeita os pedidos.
Segundo a deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP), esposa de Glauber, a defesa e juristas aliados de Glauber já levantaram uma série de pontos que podem contribuir para o recurso.
Sâmia afirmou ao g1 que eles devem utilizar todo o tempo possível para escolher qual linha de defesa será utilizada para questionar o processo no Conselho de Ética.
Além da CCJ, a defesa avalia ainda levar o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com a parlamentar, esta possibilidade é, hoje, mais remota. Há uma preferência para que o assunto seja resolvido dentro da Câmara, de forma política.
Em novembro de 2024, os advogados do parlamentar chegaram a apresentar uma ação que pedia a suspensão do processo no Conselho de Ética.
Numa primeira análise, o pedido foi rejeitado pelo relator, ministro Nunes Marques. A decisão deixa aberta a possibilidade de haja revisão após "exame mais aprofundado" de novas informações.
Neste ano, em fevereiro, ao se manifestar na ação, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, defendeu que Marques rejeite os pedidos de Glauber.
Gonet afirmou, no documento, que o processo se trata de "matéria de natureza interna corporis do Legislativo".
Denúncia
A denúncia que pode levar à cassação de Glauber Braga foi apresentada pelo Partido Novo em abril de 2024.
A sigla narra que Glauber protagonizou, dentro das dependências da Câmara, embates físicos com o membro do MBL Gabriel Costenaro e o deputado Kim Kataguiri (União-SP), um dos fundadores do movimento.
O desentendimento evoluiu para empurrões e chutes do parlamentar contra o militante, em uma tentativa de retirá-lo à força das dependências da Câmara.
Antes de o processo receber aval do conselho, Glauber Braga afirmou ao g1 que a ação contra Gabriel Costenaro foi uma "reação a provocações sistemáticas" do militante e de outros membros do MBL ao próprio parlamentar e a aliados.
Segundo o deputado, o militante do MBL teria ofendido a honra de sua mãe, que veio a falecer poucas semanas depois do tumulto na Câmara.
Solução política
Aliados de Glauber Braga têm defendido que uma solução "alternativa" para o caso seja costurada por meio de negociações políticas.
Sâmia Bomfim afirmou ao g1 que deseja que haja uma costura política entre lideranças da Casa para que a pena extrema de cassação não seja aplicada contra Glauber. De acordo com ela, lideranças da Casa e do Palácio do Planalto têm participado das tentativas de diálogo.
A deputada disse torcer que uma solução seja encontrada ainda antes da Páscoa.
Segundo ela, há uma desproporcionalidade na pena, além de uma "questão humanitária" com a decisão de Glauber em permanecer em jejum desde a última semana.
"Saídas regimentais existem para uma eventual alteração [da pena]. A questão é política mesmo. A saída é política mesmo. A gente segue buscando uma saída. A gente quer resolver o quanto antes, porque é uma situação absurda", declarou a deputada.
Uma das tentativas de negociação, de acordo com apuração do g1, foi feita diretamente com o presidente da Câmara, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB).
Dias antes de o Conselho de Ética recomendar a cassação de Glauber Braga, Motta recebeu a presidente nacional do PSOL, Paula Coradi, e a líder da sigla na Câmara, deputada Talíria Petrone (RJ).
Segundo apurou a reportagem, na ocasião, o presidente da Câmara sinalizou que o caso poderia ser discutido e dialogado com líderes partidários. Hugo Motta também indicou que daria seguimento ao processo de cassação do deputado Chiquinho Brazão (sem partido-RJ), acusado de mandar matar a vereadora do PSOL Marielle Franco.
Ao ser questionada sobre o encontro, Sâmia Bomfim afirmou que a conversa foi anterior à decisão do Conselho de Ética e que, após a aprovação da perda do mandato de Glauber pelo órgão, é preciso ampliar as negociações com outras lideranças políticas.